Anatomias da percepção
Uma resenha de Anatomia de uma Queda, de Justine Triet, e Anatomia de Um Julgamento, de Janet Malcolm
No ano passado, a New Yorker lançou um podcast chamado Critics At Large em que três críticos da revista discutem algum tema que parece a eles estar no centro de discussões recentes. Eles falam de livros ou filmes que foram lançados, mas mais do que isso, tentam identificar tendências, traçar temas e pontos comuns entre peças culturais lançadas juntas. Eles falam da obra em si, mas estão mais interessados no que essas obras falam dos nossos interesses e da cultura. Por que a gente vem contando essas histórias?
Um dos meus episódios preferidos tratava de Anatomia de Uma Queda (meu filme preferido dessa temporada de Oscar, aliás) e se chamava “Are Straight Couples Ok?”. Nesse episódio eles juntavam Anatomia de Uma Queda a Jogo Justo, um filme da Netflix que todo mundo me disse ser bem ruim, mas que também fala da relação entre uma mulher mais bem-sucedida que seu parceiro e como isso acaba em desastre.
O ponto da discussão era pensar essa ansiedade que parece estar permeando nossa cultura em relação não exatamente às mulheres que acabam mais bem-sucedidas que seus homens, mas ao fato de que as mulheres estão escolhendo elas mesmas. Ao fato de que cada vez mais mulheres entram em relacionamentos sentindo que ele é um elemento de suas vidas, não o todo delas, algo que pode ser descartado. Um arranjo profundamente desconfortável para homens — e para uma sociedade — que durante anos dependeu da narrativa de que uma mulher não era nada fora de uma relacionamento amoroso para mante-las sustentando uma série de coisas.