Eu sei, porque eu sou uma mulher que vive no mundo e, principalmente, uma mulher que cresceu nos anos 90, que uma relação contraditória e enlouquecedora com a comida é a regra de quase todas as culturas. É certamente a regra do que quer que a gente decida chamar de cultura ocidental, moderna, etc. Nós todas somos apresentadas à ideias opostas em si mesmas a respeito de como comer, como tratar nossos corpos, como controlar esses corpos e como estar com eles no mundo. Mas eu vivi essa loucura de uma forma ao mesmo tempo muito específica do meu tempo de adolescente e muito especificamente judaica.
É o maior clichê do mundo dizer que a cultura judaica é marcada por uma consciência muito profunda (adequada ou não) de que a qualquer momento você tem que fazer as malas e sair correndo. Boa parte do humor do Philip Roth, e ele é um Personagem na newsletter de hoje, acontece porque pais respondem aos seus instintos moldados por séculos e séculos de estratégias de sobrevivência no ambiente de menor risco que já existiu: a Newark do fim do século 20. Nós todos somos criados em uma mentalidade de escassez e impermanência. Tudo pode faltar, tudo pode acabar a qualquer momento.
Acontece que nessa mentalidade de escassez faltam oportunidades, comida e Bons Meninos Judeus. Como mulher eu estou sempre devendo porque em alguma contabilidade doida de avós e tias-avós nós mulheres estamos sempre em maior número, os homens sempre faltando (eu não vou me alongar aqui, não é o ponto desse texto específico) e nada te coloca mais em desvantagem na vida do que ser feia. E nada te forna mais feia do que ser gorda.