Tár é um filme que começa quebrando a mais clássica das regras cinematográficas: ele te conta, não mostra, quem é Lydia Tár e tudo que ela fez. Literalmente te conta, em um monólogo daqueles de mediador de mesa da Flip. Logo em seguida, fingindo que ainda está te contando, ele mostra que esse não é um filme sobre música, mas sobre tempo. E tempo, Tarkovsky já disse, é a matéria prima do cinema. Ou melhor, fazer um filme é esculpir o tempo, recortá-lo e domá-lo de forma que aquilo que antes era matéria amorfa se torne arte.
O Antônio Cândido diz que o tempo não é dinheiro, mas a matéria da nossa vida. Nesse sentido, o cinema é a arte de esculpir a vida, de fazer com ela o que um Bernini faz com um pedaço de mármore: tirar de um bloco a beleza que sempre esteve ali dentro, obscurecida pelo ordinário.
Tár é portanto um filme sobre cinema e, mais, um filme sobre o sentido da arte. Não um filme sobre o fazer artístico em si, mas sobre por que nós fazemos arte, qual o ponto e, de certa forma, quais as consequências.